Expulsa de casa na adolescência, mulher trans cria associação para acolher e fortalecer população LGBTQIA+: 'Reescrevendo a história'
17/05/2025
(Foto: Reprodução) Neste sábado (17) é celebrado o Dia Internacional contra a LGBTQIA+fobia, data instituída pela Organização Mundial da Saúde em 1990. Sophia Riveira, presidente da AMTT, em Bauru (SP), explica que esse combate é a principal frente de trabalho da associação. Expulsa de casa na adolescência, mulher trans cria associação para acolher e fortalecer população LGBTQIA+
Arquivo pessoal
Em 2023, Sophia Vieira, uma mulher trans de 25 anos, se mudou para Bauru (SP), no interior de SP, a cidade natal de seu companheiro. Em busca de construir uma rede de apoio e pertencimento, identificou uma lacuna na cidade: a ausência de um coletivo voltado ao acolhimento da população trans.
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A partir dessa necessidade, nasceu a Associação de Mulheridades, Transexuais e Travestis (AMTT) , com o propósito de auxiliar no enfrentamento dos desafios vividos pela comunidade LGBTQIA+ como um todo.
Neste sábado (17) é celebrado o Dia Internacional contra a LGBTQIA+fobia, data instituída pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1990. Para marcar a ocasião, o g1 conta a história de Sophia e da associação que ela fundou.
Expulsa de casa na adolescência, mulher trans cria associação para acolher e fortalecer população LGBTQIA+
Arquivo pessoal
A associação
A AMTT faz parte da história recente de Bauru. O movimento começou a ser idealizado por Sophia no final de 2024. Logo em seguida, a iniciativa saiu do papel e se concretizou oficialmente.
"Foi no final de 2024, após me inserir em alguns territórios, conhecer a cidade e as pessoas, que comecei a me engajar e idealizar a AMTT. Logo depois, tirei a ideia do papel, e assim surgiu a fundação e a materialização do que ela é hoje", conta em entrevista ao g1.
A AMTT se define como uma rede de apoio que atua em diferentes dimensões, com o objetivo de promover o bem-estar e a cidadania das pessoas. A presidente da associação explica que o trabalho se estende por várias frentes interligadas.
AMTT de Bauru também promove palestras em entidades da cidade
Arquivo pessoal
Uma dessas frentes é o acolhimento e o fortalecimento do sentimento de pertencimento, que oferece na AMTT um espaço seguro onde pessoas trans, travestis e mulheres LGBTQIA+ possam se sentir respeitadas e compreendidas.
A associação também atua na mediação e prevenção de conflitos, especialmente em situações de violência ou violações de direitos. Dessa forma, a associação promove o diálogo e a construção de soluções entre as partes envolvidas, independentemente do contexto.
Um exemplo dessa atuação é o acompanhamento de casos de crianças e jovens transexuais em instituições de ensino da cidade. Confira na reportagem abaixo:
Associação acompanha crianças e jovens transexuais em escolas de Bauru
A AMTT media situações de inclusão escolar, e oferece suporte a famílias e educadores diante dos desafios enfrentados por estudantes trans nas escolas de Bauru.
Outra frente importante envolve ações práticas voltadas para a superação das vulnerabilidades enfrentadas pela população trans. A associação realiza mensalmente a distribuição de cestas básicas e oferece atendimento psicológico em parceria com o Instituto Elas.
Além disso, promove palestras, rodas de conversa e momentos de convivência que fortalecem os vínculos entre os participantes e ampliam a rede de apoio.
"Desde o ano passado, a gente tem uma ação rotativa de cestas básicas. Um outro projeto que a gente tem é de atenção psicossocial. Agora, estamos lançando também o serviço de convivência e fortalecimento de vínculos", explica Sophia.
"Estamos, aos poucos, construindo possibilidades para reescrever essa história que tem sido tão cruel com nossos corpos, principalmente com as pessoas trans, travestis e mulheres LGBTQIA+ que atendemos", completa.
Primeira Marcha Trans de Bauru
Em janeiro de 2025, a AMTT protagonizou outro marco histórico em Bauru. No dia 30, data que celebra a visibilidade trans no Brasil, a cidade recebeu sua primeira Marcha Trans.
A marcha homenageou Luana Leon, a primeira bauruense a receber uma carteira com nome social. A iniciativa foi organizada durante a Semana da Visibilidade Trans, promovida pela AMTT, com apoio de outras entidades.
1ª Marcha Trans homenageia Luana Leon, primeira bauruense a receber a certidão com nome social
AMTT/Divulgação
Nas redes sociais, a AMTT descreveu Luana como a "matriarca da população trans" da cidade.
"O objetivo da semana, além de ser um marco para Bauru como a primeira ação estruturada para a população trans e travesti, é também um momento de proposição e compromisso. Queremos renovar e fortalecer uma movimentação que já existia na cidade, trazendo-a para um novo patamar: o da implementação real das políticas e do avanço nas demandas que nossa população tanto precisa", afirmou Sophia na época.
Bauru foi pioneira ao criar uma lei municipal para a emissão de documentos com nome social, ainda antes da regulamentação federal.
Luana Leon é dona da carteira de número 001 para trans/travestis em Bauru (SP)
Gabriela Milanezi/TV TEM
Preconceito familiar, prostituição e novos desafios
Apesar da atuação consolidada em Bauru, Sophia nasceu em Recife (PE). Ela conta que foi expulsa de casa ainda na adolescência por conta do preconceito que sofria da própria família.
Sophia Rivera, presidente da AMTT de Bauru (SP)
Reprodução/TV TEM
"Eu fui aquela criança apontada por professoras ainda no jardim de infância, que mandavam recado para minha mãe dizendo que eu precisava mudar meu jeito, porque a forma como eu corria e brincava não era adequada. São microviolências que a gente só entende depois de mais velha", relembra.
Hoje, com 27 anos, Sophia cursa ciências sociais na Universidade Federal de Pernambuco e deve concluir sua formação em 2025, de forma remota. Durante a graduação de forma presencial, precisou conciliar os estudos com o trabalho sexual para se sustentar.
"Eu dividia minha rotina entre a universidade e o trabalho sexual. Fazia isso para me manter, já que tinha saído de casa muito cedo", relata.
Essa realidade começou a mudar com sua mudança para Bauru, cidade do seu companheiro. "Cheguei aqui e foi quando também saí da prostituição. Minha ideia era vir para Bauru e compreender os novos desafios que a gente teria que enfrentar juntos", conclui.
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