Justiça manda soltar homem preso irregularmente por PMs após mandado de busca com endereço errado; delegados citam abuso de função

  • 26/06/2025
(Foto: Reprodução)
MP e juíza consideraram que todas as provas obtidas em uma busca considerada ilegal são inválidas e não podem ser usadas em processo judicial. 'A Polícia Militar não pode apurar infrações penais comuns; não pode investigar crimes. Está errado, é vergonhoso', diz presidente da Associação de Delegados. Polícia Civil cumpre mandado de busca e apreensão em São Paulo PCDF/Divulgação A Justiça de São Paulo revogou nesta quarta-feira (25) a prisão preventiva de um homem preso irregularmente por tráfico de drogas, acolhendo um pedido do Ministério Público (MP). O homem foi preso por policiais militares durante o cumprimento de um mandado de busca, o que foi considerado por delegados como "usurpação de função". A decisão da juíza Carla Santos Balestreri foi baseada exatamente na ilegalidade da busca e apreensão domiciliar que levou à prisão. Como o g1 mostrou, o mandado de busca cumprido pela Polícia Militar motivou a reação da Associação de Delegados da Polícia Civil, que entende que o pedido para mandados se trata de uma ação exclusiva dos investigadores, e não dos PMs, e apontaram uma suposta “usurpação” de funções com risco até para anulação de provas colhidas. 👮‍♂️ O homem foi preso em 30 de maio de 2025, por volta das 16h, na Rua Arquiteto Professor Chaves, 37, Conjunto Habitacional Castro Alves, em São Paulo. No local, a Polícia Militar teria encontrado uma mochila com 342 porções de maconha, 556 porções de cocaína e 16 porções de cocaína/crack, além de R$ 136,05. A prisão em flagrante foi convertida em prisão preventiva. No entanto, o Ministério Público concluiu que a diligência que resultou na prisão foi ilegal por diversas razões, aplicando a "Teoria da Árvore dos Frutos Envenenados". Isso significa que todas as provas obtidas em uma busca considerada ilegal são inválidas e não podem ser usadas em processo judicial. "Nós avisamos: isso não vai dar certo. A Polícia Militar não pode apurar infrações penais comuns; não pode investigar crimes. Está errado: além de inconstitucional e de não ser do interesse da população, é vergonhoso. O resultado é esse: um traficante solto por causa dessa atuação tresloucada da Polícia Militar. E policiais militares podendo ser responsabilizadas, vai sobrar para quem cumpriu o mandado, e não para o oficial que solicitou", afirmou o presidente da Associação dos Delegados de São Paulo, André Pereira. As principais irregularidades apontadas pelo MP são: Divergência de endereço na requisição da PM e na execução: A Polícia Militar havia solicitado e obtido um mandado de busca e apreensão para a Rua Arquiteto Professor Chaves, nº 1, Cidade Tiradentes. Contudo, a busca e a prisão ocorreram na Rua Arquiteto Professor Chaves, 37, Conjunto Habitacional Castro Alves. A Polícia Civil, em um relatório de investigação posterior, diligenciou ao local e constatou que o endereço nº 1 é, na verdade, uma creche (CEI Sabor de Infância), que funciona lá desde 2012 e não teve presença policial no dia dos fatos. O endereço do homem preso e de seu pai é o nº 37 da mesma rua, localizado a cerca de 200 metros do nº 1. O MP argumentou que a ordem judicial, ao se referir apenas ao nº 1, não poderia abranger "TODAS as residências da 'rua' ou 'viela'", que é composta por diversas habitações. Isso configuraria uma 'devassa indiscriminada' da vida privada das pessoas", pois o mandado deve indicar com precisão a casa a ser diligenciada. O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça já consolidaram que um mandado de busca e apreensão não possui "caráter itinerante" e deve ser cumprido no endereço especificado, sob pena de nulidade das provas obtidas. O cumprimento em local diferente, sem nova autorização judicial, viola o direito à inviolabilidade do domicílio. Em nota enviada ao g1 em 6 de junho, a Secretaria da Segurança afirmou que "a PM localizou um depósito de drogas em uma área com imóveis irregulares”. “Com o apoio de cães farejadores, foram apreendidos 3,4 kg de maconha, mais de 500 g de crack, dinheiro e um caderno com anotações. A ação ocorreu em um corredor fechado usado para o tráfico, razão pela qual solicitou-se o competente mandado para ingressar nas habitações lá existentes”, informou. O g1 procurou novamente a secretaria e aguarda posicionamento. Outras condutas irregulares da PM observadas pelo MP: Entrada sem mandado e ameaças: o pai do homem preso relatou que os policiais entraram na residência sem apresentar nenhum mandado ou autorização, com uma arma apontada para o seu rosto, e já estavam dentro do imóvel quando ele foi atendê-los. Ele também foi coagido a assinar um documento sem conseguir ler o conteúdo. Agressão e coerção: ele também afirmou que o filho foi agredido com chutes nas pernas e coagido a fornecer a senha de seu celular. O irmão do preso foi insultado e ameaçado de morte por olhar para o rosto dos policiais. Celular acessado, mas não apreendido: o celular do investigado foi acessado pelos policiais, que teriam encontrado "importantes provas" de tráfico. Contudo, o aparelho não foi apreendido oficialmente nem levado para a delegacia, sendo "deixado na residência". O MP questionou a cadeia de custódia de um vestígio tão relevante, já que o celular não está mais na residência, segundo o preso e seu pai. "Pescaria probatória": testemunhas e moradores da rua relataram que a polícia realizou buscas em diversas outras casas na mesma rua, em muitos casos, sem exibir mandado, forçando a entrada de forma agressiva e abusiva. Isso foi classificado pelo MP como uma "pescaria probatória". Uma testemunha protegida chegou a fotografar um suposto mandado exibido por um policial, mas foi forçada a abrir o portão sob ameaça. A promotora de Justiça Adriana Ribeiro Soares de Morais concluiu que, apesar da quantidade de drogas apreendidas e dos antecedentes criminais do indivíduo, as irregularidades na busca tornam todas as provas ilícitas e inadmissíveis, inviabilizando a continuidade do processo criminal. A juíza Carla Santos Balestreri concordou e considerou "inviável a manutenção da custódia". Civil x PM Os cumprimentos de mandados são mais um capítulo de disputas entre as polícias Civil e Militar no estado. No início do mês, a PM anunciou que levará presos com mandado judicial direto para o presídio, sem passar pela delegacia, como comumente é feito. A medida, que começou pela região central da capital, também foi alvo de críticas da Associação de Delegados, que vê inconstitucionalidade (leia mais abaixo). No ano passado, o motivo do racha era a atribuição para registro de Termos Circunstanciados de Ocorrência (TCO). "Mais uma vez, estamos diante da pauta fracassada do ciclo completo de Polícia Militar, que é a formalização de ocorrências e procedimentos criminais sem passar pela Delegacia. Esse caso em São Paulo, na maior capital do país, é simbólico; foi um arremedo de investigação totalmente ilegal: um mandado de busca solicitado pela pessoa errada [um oficial da PM] e na casa errada [uma creche], com um juiz e um promotor 'matriculados' em um procedimento errado, desde a origem", disse André. Interpretações sobre as funções da PM e da Polícia Civil A desembargadora Ivana David, do TJ-SP, que não participou da apreciação do pedido em questão, explica que o mandado de busca é um meio de obtenção de prova no curso de uma investigação. “Se a PM não pode investigar, logicamente que não poderia requerer um mandado para obter provas”, diz. A magistrada também vê risco de as evidências reunidas serem anuladas a pedido da defesa. “De pronto, o advogado pode pedir a nulidade. E se houver prisões decorrentes disso e outros desdobramentos, tudo que se seguiu também pode ser afetado.” No entanto, a interpretação não tem consenso nas instâncias superiores. Em novembro de 2024, o ministro Rogerio Schietti Cruz, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), analisou um recurso que pedia a nulidade de provas por “usurpação pela Polícia Militar das atividades constitucionais da Polícia Civil, notadamente das atividades investigativas”. O magistrado negou o pedido e disse que o entendimento da Corte está firmado no sentido da legalidade de investigações realizadas pela PM, uma vez “que estão ligadas, tão somente, à colheita de elementos informativos quanto à autoria e à materialidade das infrações penais, razão por que não se configura nenhuma usurpação de competências”, como demonstrado por uma jurisprudência usada em 2021 em um caso similar. Já no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Luís Roberto Barroso analisou um caso da mesma natureza em 2022. Ele negou o pedido feito por uma defesa de um investigado em uma ocorrência em Minas Gerais. “O fato de ter sido atribuído à Polícia Civil a competência investigativa não significa dizer que tal incumbência também não possa ser realizada pela Polícia Militar, já que se trata de competência precípua daquele órgão e não exclusiva”, escreveu na decisão. Prisões sem passar pela delegacia A Polícia Militar de São Paulo iniciou no dia 4 de junho um projeto-piloto para condução direta de pessoas presas por força de mandado judicial a unidades prisionais, sem passar por delegacias da Polícia Civil. Denominado de SPRecrim, a iniciativa começa na área do Comando de Policiamento do Centro da capital paulista e também motivou críticas das Associação de Delegados do estado, que vê inconstitucionalidade na medida. Em comunicado, a PM diz que, na abordagem a pessoas procuradas da Justiça, deverá ser verificado a validade do mandado de prisão no Banco Nacional de Medidas Penais e Prisões (BNMP), do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O acusado, então, deve ser conduzido para exame de corpo de delito no IML e, em seguida, diretamente para o CDP 4 de Pinheiros, no caso dos homens, ou à Penitenciária Feminina da Capital, no Carandiru, para mulheres. Para André, presidente da associação, a medida é inconstitucional. “Esse projeto-piloto é ilegal, pois impede a atuação do delegado de Polícia, que é o primeiro garantidor dos direitos fundamentais, e, principalmente, do juiz de garantias, responsável por aferir a legalidade de todas as circunstâncias relacionadas ao cumprimento do mandado de prisão. Por meros atos internos, a Polícia Militar está revogando a Constituição Federal e as Resoluções do CNJ”, declarou. A Secretaria da Segurança Pública afirmou, por meio de nota, que o projeto tem o objetivo de combater a reincidência criminal, "com a participação de todas as forças policiais do Estado: Civil, Militar, Técnico-Científica e Penal. A iniciativa é resultado de um processo técnico e colaborativo construído ao longo da atual gestão em amplas discussões entre as instituições." Delegados da Polícia Civil em São Paulo têm a 2ª pior remuneração entre todos os estados do Brasil, aponta estudo "Nos próximos 15 dias úteis, será avaliado na região central da Capital (áreas da 1ª Seccional e do CPA/M-1) um fluxo operacional inédito, que automatiza o envio de informações sobre criminosos presos e permite que procurados com mandado de prisão vigente (civil, preventiva ou definitiva em regime fechado) sejam encaminhados diretamente às unidades prisionais — desde que não haja outras ocorrências associadas no momento da prisão", diz o texto. Especialistas em segurança pública ouvidos pelo g1 dizem que o projeto menospreza a autoridade da Polícia Civil e do Judiciário. Quais as diferenças entre a prisão temporária e a preventiva?

FONTE: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2025/06/26/justica-manda-soltar-homem-preso-irregularmente-por-pms-apos-mandado-de-busca-com-endereco-errado-delegados-citam-abuso-de-funcao.ghtml


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